Escândalo interno
De um corpo subvertido de valores
Na ferida aberta no meu estômago
Está meu vômito engolido novamente
A repetição do podre, do pobre,
Do nada que me faz fraco
Pessoas do avesso
Pessoas que confudem
Que se iludem, que se misturam
Eu não quero acreditar em quem sou, em quem és
Espero ansiosa a morte
A morte do sofrer
Do me ver
A morte do desacreditar
Essa agonia sem fim
Esse ser umano ou humano
De fezes e falas
De ferida e de flor
E beleza e estranheza
Não me reconheço em nada
Em coisa alguma
Em coisa pessoa alguma
Gosto do cílio que cai lentamente
Daquele canto de olho perverso
Desse olhar imerso no nada
Gosto do oco, do louco, do vazio, da falta
Do seu ombro esquerdo
Dos seus olhos cansados e vermelhos
Da olheira que se inicia como se coresse em direção ao rio aquele mar de lágrimas quentes
Que se transformam em frias perguntas
Que se perdem perigosamente dentro de nós
Gosto do que não sei, do que não vejo, do impreciso, do indeciso
Porque por ser desconhecido ainda não dói, ainda não sente, ainda não é, ainda não ama
Eu não quero mais pensar
Pensar dói
Pensar ofende
Pensar perfura
Pensar machuca
Pensar traz morte
Traz enjôo
Quero ficar só, sozinha no meio do nada
Talvez no meio daquele vômito engolido novamente no meu estômago
Só com a lembrança do seu cílio que cai
Do seu triste e perverso canto de olho
Do seu ombro esquerdo
E do seu iniciar de olheiras
No meio de uma grande e infinita plantação de pontos de interrogação
Cuja grama é verde, verde.
Maria Amélia